Se eu puder dar um conselho a uma imigrante, seria este:
Não deixe uma oportunidade passar. Nunca!
Quando nos colocamos na posição de imigrantes - por escolha nossa, por sinal, precisamos entender que nem sempre aparecerão oportunidades boas logo de cara, portanto quando elas aparecerem não diga não instantaneamente, reflita bem e de preferência diga sim.
Eu tive apenas uma oportunidade que não aproveitei em 16 anos de Canadá, e me pergunto até hoje porque não disse sim.
Havia sido indicada para trabalhar em uma empresa de contabilidade bem famosa de Calgary. O pai de um amigo do meu marido havia me conhecido e comentou com seu amigo, que por sua vez era gerente na empresa. Aquele famoso quem indica, sempre tão valorizado em terras imigrantes (contatos são tudo). Uma semana antes, porém, outro amigo havia comentado comigo que o órgão do governo onde ele trabalhava, estava com uma vaga aberta e eu deveria me candidatar. Nesta época, eu estava no Canadá há 1 ano. Trabalhava em uma escola infantil e meu inglês não era uma Brastemp (mas também, era assistente da turma de bebês, não tinha com quem praticar :).
Fui corajosa e apliquei para as duas oportunidades.
ENTREVISTAS:
Me dá um calafrio só de lembrar, meu Deus que sufoco.
A entrevista na empresa de contabilidade foi tranquila, suei frio mas foi uma conversa, então me sai bem, fui contratada na hora e comecei uns dias depois na posição de arquivadora.
A segunda entrevista foi uma das experiências mais engraçadas que ja vivi na vida, rindo para não chorar. Ao chegar, me colocaram em uma sala enorme com uma mesa gigantesca de reuniões. Na minha frente colocaram um bloco e uma caneta. Fiquei ali tranquila esperando a pessoa chegar, mal sabia eu que seriam pessoas e não apenas uma. Entraram na sala 3 funcionários, dois senhores muito sérios e uma senhora mais risonha. Lembrando: meu inglês era bem básico, bem mesmo!
Os três avisaram que o cargo era para ser assistente administrativa do setor de agricultura da cidade de Calgary e eu estaria a frente das compras de passagens aéreas para a gerência que viajava a trabalho. A entrevista "oral" terminou após 30 minutos e os senhores se retiraram e fui avisada que agora eu estaria pronta para o teste escrito. Eu..."I'm sorry, what?". Pensa num ataque cardíaco kkkk.
Encarnei a advogada (estava cursando Direito no Brasil antes de imigrar),fiz o teste e na ultima pergunta eu me lasquei: " Agora explique a definição de gerenciamento horizontal e comente." Isso com a senhora sentada a minha frente me olhando. Olho para o papel e o espaço destinado a resposta era basicamente uma redação de vestibular. Comecei a resposta dizendo que infelizmente eu não sabia o significado real, mas que eu escreveria sobre o que eu achava que era gerenciamento horizontal (ponto pela honestidade). Escrevi a pagina inteira, não me perguntem daonde eu tirei tantas idéias para uma definição que eu não sabia.....a necessidade é a mãe da imaginação. Entreguei a folha, agradeci e fui embora, com a certeza absoluta que tinha queimado minhas chances de passar.
Na segunda-feira iniciei no escritório de contabilidade e passei aquele sufoco normal de adaptação ao primeiro emprego em terras canadenses, falando ingles com adultos (kkk) e lidando com a pressão de ter que me sair bem porque eu precisava daquele emprego com salário bem maior do que eu ganhava na escola infantil.
Trinta dias se passaram e já estava mais ambientada e segura de que eu tinha capacidade para fazer minhas tarefas, paralelamente a tensão de precisar entender um inglês profissional de uma empresa de contabilidade. Eles não queriam saber se eu era recém chegada e minha experiência era falando inglês com bebês, eles exigiam que eu entendesse e executasse as tarefas. Até que um dia chego em casa e tinha uma mensagem na secretaria eletrônica do telefone fixo. Ouvi e me deu uma dor de estômago instantânea:
" Boa tarde Rita, aqui é da prefeitura de Calgary. É com muito prazer que lhe informo que você foi aceita para o cargo do setor de agricultura, por favor nos ligue na segunda-feira para acertar detalhes com o setor de RH.....e por sinal, seu salário será X."
Sentei no sofá com aquela taquicardia e dor de estômago instantânea que só quem sofre de ansiedade conhece. Pensei meu Deus do céu e agora? Eu já estou trabalhando há um mês na empresa de contabilidade, já passei o sufoco de um mês de adaptação, quanta coisa já aprendi, já fiz amigos, já me sinto numa zona de conforto boa (ansiedade falando novamente), eu quero largar tudo e ir trabalhar num emprego com alta carga de pressão? Lidando com companhias aéreas, trocando passagens de última hora, reservando hoteis, lidando com profissionais da área estressados com viagens, todos falando inglês no meu ouvido e com pressão de nada dar errado, sem dó nem piedade da minha insegurança imigrante.
Detalhe: o salário era mais que o dobro do que eu estava ganhando na empresa de contabilidade.
Pensei, pensei, pensei e decidi não aceitar.
Liguei para a gerente da prefeitura, expliquei que não aceitaria e perguntei porque eles me escolheram se eu sabia que eu não soube responder aquela pergunta. Ela disse que apreciaram minha honestidade e criatividade na resposta.
Na época me convenci que não seria bom para mim, que o desafio que eu estava vivendo nesta empresa estava sendo suficiente para meu crescimento profissional e que eu cresceria dentro da empresa eventualmente, mais do que estar estagnada em uma função dentro do governo onde seria muito mais dificil de crescer....bla bla bla.
De fato, os 4 anos em que trabalhei na empresa de contabilidade me ensinaram muito, me colocaram no caminho muitas pedras com as quais aprendi. Fui promovida, trabalhei com uma sócia extremamente perfeccionista e exigente, sobrevivi, aprendi demais.......mas a verdade é que a escolha que fiz foi baseada em medo e insegurança, não em razões reais. Financeiramente, também, perdi a oportunidade de ganhar mais que o dobro, quando teria sido uma ajuda imensa na minha vida financeira.
Após esta experiência, eu decidi que nenhuma outra oportunidade cruzaria meu caminho sem eu analisa-la sem medo. Sem medo de falar inglês errado, sem medo de me sentir insegura, sem medo de dar um passo maior que a perna.
O que aprendi com esta oportunidade perdida foi:
1- NÃO HÁ NADA DE ERRADO EM SE SENTIR INSEGURA
Quem falou que precisamos estar seguras de si para fazer as coisas? Comece insegura mesmo e toque o baile. A segurança virá com o tempo, com a experiência.
2- FRIO NA BARRIGA É SINAL DE QUE VALERÁ A PENA
No geral, o que causa desconforto nos leva a grandes oportunidades. Esta sensação pode ser combustível para você fazer o que não faria normalmente. Lembre-se: imigrante PRECISA ser corajoso.
3- SE VOCÊ FOR ESCOLHIDA É PORQUE JULGARAM VOCÊ CAPAZ
Quantas vezes nos julgamos incapazes, só vemos nossas faltas e defeitos, e não nos damos crédito. Precisamos que um terceiro, um estranho, nos diga: eu confio em ti, ta aqui a vaga!
4- NÃO COMETA O MESMO ERRO DUAS VEZES
Eu sempre procuro cometer um erro apenas uma vez (hahaha, tento né?), e esta lição eu aprendi lá em 2005. Desde então eu me jogo. Foi assim que eu peguei a oportunidade e falei " Eu compro a escola", e me tornei empresaria, foi assim que eu fundei o Delaz e desenho o futuro das minhas empresas. A oportunidade apareceu eu pego, não apareceu? Eu CRIO!